sábado, 31 de março de 2012

Revoluções, Golpes e Estados

         Todos os anos, o mês de março traz dias emblemáticos para todos nós brasileiros. Por estarmos no hemisfério sul, porção tropical do nosso globo, as Águas de Março vão caindo, filosoficamente, como que para lavar o calor do veraneio que passou. Passou também o carnaval e, na verdade, já está quase na hora do Redentor subir para o andar de cima e derramar seu sangue em nome da criação – pretensa e imperfeita – que o seu suposto e invisível pai – também muito pretensioso –colocou no dito planeta azul. Enfim, o terceiro mês do ano traz consigo um quê de recomeço e há quem diga que é por essas épocas que o nosso continente tupiniquim começa, de fato, a funcionar.
Para além de todas estas coincidências climáticas, religiosas, poéticas, econômicas e sociais, é sempre bom lembrar que, certa vez, resolveram traçar um “recomeço” justamente em fins de março.
            No ano de 1964, o fatídico 31 de março representou uma efeméride de extrema importância no nosso calendário político e histórico. Diante de uma mal explicada “ameaça comunista”, os setores mais conservadores das castas militares e da nossa Sociedade Civil (é sempre bom lembrar) encamparam uma iniciativa no intuito de preservar a “moral, os “bons costumes” e, porque não, a violência como bases de sustentação de uma sociedade que se modernizava e intensificava seu processo de integração ao resto do globo terrestre. Estava aberta a temporada de caça aos comunistas, “subversivos” e a qualquer pessoa que, maliciosamente, quisesse expressar uma opinião política questionando os interesses idôneos da tradição, da família e da propriedade.
            Há quem chame de Golpe, há quem diga que foi uma Revolução e, diante do ocorrido, o Estado ditatorial foi um fato. Um fato político, cultural e até um “milagre econômico”. Em vinte anos de esboroamento das nossas garantias civis, políticas, jurídicas e humanas, um complexo de instituições retrógradas tomou a frente do carro social. Na mídia, nos clubes, nas igrejas e nos estádios eram noventa milhões em ação, enquanto o cálice da censura estava por transbordar-se.
            Certamente, tais episódios corroboravam para tecer a configuração de uma conjuntura internacional onde aparecia uma guerra dita fria, ao mesmo tempo em que refletia as disputas entre os dois grandes blocos rivais: o “socialista” e o “capitalista”. Diante de um globo bi-polarizado, no Brasil, o Tio Sam não pagou nada, mas nós pagamos. E continuamos a pagar até os dias de hoje.
            Deste modo, no 31/03/64, parece que alguém – à época de farda, hoje de pijama - ficou receoso e pensou: “Não vamos deixar nada para abril, vai que a gente sai vestido dia 1º e todo mundo pensa que o desfile é de brincadeira, que é dia de marmelada”... Quem nos dera tivesse sido, uma tragédia política, mais uma pegadinha de primeiro de abril. No fim das contas, ficam gravadas, nos porões, as lembranças, as memórias, as guerras; entre Golpes e Revoluções nosso passado sedimenta-se em um Estado de traumas.

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