sábado, 6 de outubro de 2012


A lógica perversa da Democracy Party

            “Ô abre alas que eu quero passar (...)”....
Ultimamente, tem sido um deleite passear pelas ruas da cidade. Projetos de confete e interesses de serpentina inundam os ânimos da urbe em votivas promessas que mais parecem amor de carnaval. É a festa da democracia, um acontecimento que mobiliza nossos concidadãos, pelo menos, a cada dois anos.
            Diante de tão Cesário fato, os ciclos estruturais da nossa política parecem repetir antigos vícios. O processo eleitoral, que ocorre no nosso querido país-continente, é encarado sob uma perversa lógica circense. Empurra-se algo que poderíamos chamar de “piada impressa” a uma população que, por sua vez, sente-se hipnotizada diante de uma enxurrada de conceitos. Palavras que, maquiavelicamente, preenchem o espaço semântico da nossa infante experiência eleitoral do pós-ditadura: democracia, povo, partido, oposição. Falam até em uma fantasiosa ficha limpa.
A partir do problema, caçar bruxas é um esporte de extrema dificuldade, sobretudo quando as bruxas parecem fadas-madrinhas. Torna-se uma tarefa hercúlea procurar os culpados pela lamentável situação do nosso processo eleitoral. Neste sentido, apenas vislumbra-se um jogo onde mensageiros de todas as cores passam o dia a se apontar, como se seus mentores proviessem de um ficheiro sem rasuras ou borrões. Importam apenas os mimos, concretos ou abstratos. Salvo em raras exceções, passa-se o dia a desferir acusações, reforçando promessas vazias e códigos morais insustentáveis. Projetos que se desvencilham de debates basilares para uma dinâmica social mais afeita aos direitos que, em tese, seriam prerrogativas básicas garantidas constitucionalmente aos indivíduos.
No final, a “Democracia” abraça cada cidadão por alguns meses, em um jogo de pura alegria. O problema é que, por mais que ela queira viver com todos, parece sempre voltar para seus verdadeiros esposados, que nós, pobres amantes, definitivamente não conhecemos. Ou conhecemos alguns, ignoramos outros e não podemos ver muitos.
O saldo dessa querela é que no próximo carnaval, quando sairmos procurando a Democracia, entoaremos em tristeza: “Mas chegou o carnaval e ela não desfilou”. Parece que essa festa vai deixar uma incômoda ressaca de Democracia. 

sábado, 31 de março de 2012

Revoluções, Golpes e Estados

         Todos os anos, o mês de março traz dias emblemáticos para todos nós brasileiros. Por estarmos no hemisfério sul, porção tropical do nosso globo, as Águas de Março vão caindo, filosoficamente, como que para lavar o calor do veraneio que passou. Passou também o carnaval e, na verdade, já está quase na hora do Redentor subir para o andar de cima e derramar seu sangue em nome da criação – pretensa e imperfeita – que o seu suposto e invisível pai – também muito pretensioso –colocou no dito planeta azul. Enfim, o terceiro mês do ano traz consigo um quê de recomeço e há quem diga que é por essas épocas que o nosso continente tupiniquim começa, de fato, a funcionar.
Para além de todas estas coincidências climáticas, religiosas, poéticas, econômicas e sociais, é sempre bom lembrar que, certa vez, resolveram traçar um “recomeço” justamente em fins de março.
            No ano de 1964, o fatídico 31 de março representou uma efeméride de extrema importância no nosso calendário político e histórico. Diante de uma mal explicada “ameaça comunista”, os setores mais conservadores das castas militares e da nossa Sociedade Civil (é sempre bom lembrar) encamparam uma iniciativa no intuito de preservar a “moral, os “bons costumes” e, porque não, a violência como bases de sustentação de uma sociedade que se modernizava e intensificava seu processo de integração ao resto do globo terrestre. Estava aberta a temporada de caça aos comunistas, “subversivos” e a qualquer pessoa que, maliciosamente, quisesse expressar uma opinião política questionando os interesses idôneos da tradição, da família e da propriedade.
            Há quem chame de Golpe, há quem diga que foi uma Revolução e, diante do ocorrido, o Estado ditatorial foi um fato. Um fato político, cultural e até um “milagre econômico”. Em vinte anos de esboroamento das nossas garantias civis, políticas, jurídicas e humanas, um complexo de instituições retrógradas tomou a frente do carro social. Na mídia, nos clubes, nas igrejas e nos estádios eram noventa milhões em ação, enquanto o cálice da censura estava por transbordar-se.
            Certamente, tais episódios corroboravam para tecer a configuração de uma conjuntura internacional onde aparecia uma guerra dita fria, ao mesmo tempo em que refletia as disputas entre os dois grandes blocos rivais: o “socialista” e o “capitalista”. Diante de um globo bi-polarizado, no Brasil, o Tio Sam não pagou nada, mas nós pagamos. E continuamos a pagar até os dias de hoje.
            Deste modo, no 31/03/64, parece que alguém – à época de farda, hoje de pijama - ficou receoso e pensou: “Não vamos deixar nada para abril, vai que a gente sai vestido dia 1º e todo mundo pensa que o desfile é de brincadeira, que é dia de marmelada”... Quem nos dera tivesse sido, uma tragédia política, mais uma pegadinha de primeiro de abril. No fim das contas, ficam gravadas, nos porões, as lembranças, as memórias, as guerras; entre Golpes e Revoluções nosso passado sedimenta-se em um Estado de traumas.

segunda-feira, 30 de janeiro de 2012

O partido do Café com Leite

Recentemente, pelos idos de 2009, o mundo assistiu à criação de um movimento que denota toda a onda de conservadorismo que ronda o ocidente judaico-cristão proto-democrático. Baluarte de ideias um tanto questionáveis, inclusive sob o prisma do respeito à individualidade, o “Tea Party” (Partido do Chá, em alusão ao episódio do Chá de Boston) representa uma seara de ervas daninhas que crescem a cada dia no solo estadunidense. Entretanto, o “uprising” dos afãs conservadores não ocorre apenas na terra do Tio Sam, tais ideias florescem também nas terras tupiniquins e, aqui, tem gosto de café com leite.
Nos tempos da nossa primeira velha República, dois importantes estados brasileiros impunham sua hegemonia política no plano nacional. Por mais que sejam complexos e questionáveis os arranjos feitos entre São Paulo e Minas Gerai naquela época, é fato que a proeminência política e econômica dos dois territórios contribuiu para que o famoso “café com leite” reinasse por um bom tempo no Catete.
Hoje em dia, após muitas lutas e traumas, diante de um horizonte que aponta para uma consolidação da democracia no país, os bebedores de café e leite continuam a aprontar. Apesar de não estarem tão articulados como outrora, representam uma verdadeira tragédia política, econômica e social para seus respectivos estados. Especializaram-se em peculato, uso ilícito do monopólio da força física, amordaçar a imprensa e outros tantos crimes que podem ser enquadrados até em homicídio. Pois bem, parece que querem se aproximar do gosto amargo do Chá de Boston.
Portanto, salvas as devidas proporções, estamos diante de um macroprocesso envolvendo estruturas parecidas em grandes países da América que, após uma experiência de mais de três séculos sob a égide do sistema escravista, não conseguiram “universalizar” o conceito de cidadania e garantir direitos básicos à população. O grande problema é que determinados setores de tais sociedades, detentores de uma gama variada de poderes, usam sua capacidade de mobilização de recursos para manter seu status quo, a qualquer custo.
Não se trata aqui de uma apologia ao pensamento socialista, comunista ou qualquer nome que os homens do chá e do café usam para alcunhar seus algozes. Antes de chegar à discussão da famigerada luta de classes é preciso garantir a refeição, o direito de ir e vir, à moradia e mesmo o direito à vida. Cabe ao Estado garantir tais prerrogativas. Enfim, é preciso repartir o pão antes mesmo de fazer o café da manhã ou o chá das 5:00 P.M.